quarta-feira, 27 de julho de 2011

Férias parte 1: Vida no Agreste Pernambucano

 
Quando viajei para conhecer Pernambuco, levei comigo na bagagem mais que expectativas de ver belas paisagens. O que me motivou a conhecer tal estado foi uma grande vontade de “passar a limpo” muitas estórias contadas desde que era criança. Meus pais são de lá e durante toda minha vida escutei longas descrições de como era morar no sertão, ou na roça como diziam alguns.  As marcas deixadas pela seca, sem dúvida são o elemento comum a todas essas histórias, misturando-se muitas vezes às histórias dos livros que li na adolescência ou quando adulto, como Vidas Secas e Grande Sertão: Veredas, formando pinturas com detalhes impressionantes, e na maioria das vezes tristes.

Ao chegar nessas terras e vivenciar um pouco da vida rural nas casas de meus tios, não encontrei a tão falada miséria ou pobreza extrema, apenas um jeito rural de viver, as vezes meio novelesco, com direito a celular pré-pago, antena parabólica para assistir a novela, dvd da Lady Gaga e Aviões do Forró.

As escolas não são mais como aquelas do livro Menino de Engenho, e todas as crianças estão matriculadas, sendo a evasão mínima devido ao programa Bolsa Família. Em todas as cidades em que passei, os uniformes oferecidos pelas prefeituras enfeitam a paisagem, como bandeirinhas nas pinturas de Alfredo Volpi.

Nesses dias, encontrei um pouco da sinceridade que nos falta para falar dos problemas cotidianos, encontrei um pouco do deboche e do bom humor descarado nordestino para falar de tudo que temos vontade, longe da polidez muitas vezes fingida dos paulistas. No começo fiquei constrangido, mas depois entendi que “estava no sangue”.

Vi que o INSS sustenta as senhoras e senhores, aposentados rurais com a pele curtida e as marcas no rosto de tempos outrora muito difíceis. Esses por sua vez, amparam filhos e netos, que tem dificuldade de encontrar empregos fixos, com remuneração satisfatória. A fome foi substituída por uma certa fartura, com direito a muitas opções de “mistura” e refrigerante.

Á água, antes tão escassa já não aflige. Além dos açudes, as cisternas construídas pelo governo trouxeram segurança para as famílias. A luz também chegou, trazendo todas as opções, que só faltam mesmo a quem não queira.

Voltei de lá um pouco mais tranquilo,  mas nada de dizer que valorizo o conforto da cidade grande, pois viver aqui ou viver lá hoje são opções que as famílias podem fazer. Minha mãe após trinta anos sem ver a terra natal, voltou consciente de que não se adapta mais, e ao mesmo tempo encontrei moradores que não entendem que vida é essa que levamos nesse “inferno” chamado São Paulo. Agora, quando ouvir as estórias nos almoços de família, não conseguirei imaginar com a mesma languidez o passado de meus pais, parecerá que estão caprichando um pouco demais nas tintas, no sofrimento de seu passado...

Abaixo, alguns detalhes atuais dessa vida rural que nos inspira a pensar em uma vida mais simples:


Aproveitando a água:
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Vista de lago em Agrestina-PE: a água da chuva pode ser
armazenada em pequenos lagos ou açudes, de onde
 é transportada para as casas. 

Vista de cisterna em Agrestina-PE: são caixas d´água
com capacidade para cerca de 16 mil litros que
 armazenam a água da chuva através de canaletas.
A matéria-prima foi doada pelo governo e a mão de obra
 é da própria população. Praticamente todas as casas dos
 bairros afastados possuem cisternas desse tipo.
Vista externa de detalhe em cisterna, na cidade de
Agrestina-PE.
   
Vista interna de casa em Agrestina-PE:
Após serem retiradas das cisternas ou açudes a
 água para consumo é armazenada em potes
de cerâmica, para que mantenha uma
temperatura agradável e fique "fresquinha".
Atualmente muitas famílias também compram
galões de água para o consumo, deixando
a água armazenada apenas para as demais
 tarefas como tomar banho e lavar roupas.
 
Alimentação em família:


Exemplo de lanche da noite:
  
  • Nhame
  • Queijo derretido
  • Café
  • Carne de bode cozida
  • Jabá frita
  • Pão
  • Banana da terra cozida
  • Castanhas de caju torradas

Variações:

  • Vaca atolada
  • Sarapatel
  • Curau e Cuscuz
  • Tapioca
  • Pamonha salgada

Preparando o porco para dividir entre os vizinhos:

 Nesse vídeo temos um porco que foi comprado para ser dividido entre os vizinhos. Ele está sendo limpo para ser aberto. Os moradores consideram esse processo o melhor possível, pois dá garantia da procedência da carne.
 
Expressões regionais:
 
  • “Dar um pitu”: enrolar, passar a pena.
  • Pessoa “virada”: pessoa safada.
  • Pessoa “água de cuscuz”: pessoa sem brilho.
  • Pense como cheguei cedo, pense como o dia ta lindo, pense como choveu ontem...
  • Merendar: comer uma das refeições.
  • Dudu: geladinho.


Caçando e pescando:
Caçar nos sítios é uma atividade
 comum. Nas casas encontramos
 espingardas utilizadas para essa
prática. Além da caça a pesca também
faz parte da rotina de alguns.
 
Visitando a feira:

 
Vista externa do açougue público municipal em Cupira-PE.

Vista interna do Açougue Público Municipal de Cupira-PE:
as carnes são expostas e vendidas em barracas, sendo
normalmente cortadas (abatidas) no dia. Para a população
da cidade essa carne é a melhor opção de compra, pois
está "fresquinha".

 
Vista externa em feira de Cupira-PE: venda de cds piratas
é prática comum.

Vista interna do mercado público municipal de Cupira-PE:
aqui é vendida a produção das famílias que moram
nos sítios. Feijão, farinha de mandioca, milho etc..

Vista de uma barraca de queijos em feira de Cupira-PE:
produção caseira é levada as feiras para comercialização.

Transporte de pessoas:

 
Transporte utilizado na cidade de Agrestina-PE: para
 chegar as regiões mais afastadas, onde não existem
 ruas asfaltadas, faz-se necessário o transporte particular,
feito por moradores em horários diários.

 
Vista interna de transporte utilizado na cidade de
Agrestina-PE: o aperto faz parte do transporte para
 chegar as áreas mais afastadas.
Vista de ponto de mototaxi transporte utilizado na cidade
de Agrestina-PE.
Vista de estrada de terra na cidade de Agrestina-PE: nos
períodos de chuva o transporte com ônibus fica
impossibilitado, permitindo-se apenas a
passagem com motos ou carros com tração.

 
Fazendo farinha de mandioca:

 
Plantação de mandioca em sitio de Agrestina-PE: após
crescerem arrancados e as raízes são descascadas para
processamento.

Casa de farinha comunitária em Agrestina-PE: foram
construídas pela prefeitura nos vilarejos e possuem
a estrutura para a produção da farinha de
mandioca, como pagamento os produtores
entregam 5 kg a cada saco de 60 kg.

 
Vista interna de casa de farinha comunitária
em Agrestina-PE: após ser descascada e
lavada a mandioca é colocada nesse
processador elétrico para ser triturada.
Vista interna de casa de farinha comunitária
em Agrestina-PE: a mandioca triturada é colocada em
sacos e prensada nessa outra máquina, para retirar o
excesso de água.

 
Vista interna de casa de farinha comunitária
em Agrestina-PE: a mandioca triturada e prensada
é colocada nesse forno aquecido a lenha.
O forno é elétrico e gira, impedindo que a farinha
prenda no fundo enquanto seca, ficando igual a que
compramos no mercado.

 
Vista externa de casa de farinha comunitária
em Agrestina-PE: local onde é alimentado o
 forno que seca a farinha, nos fundos da casa.
Vista de feira em Cupira-PE: Nas feiras
 é vendida a farinha produzida pelas
 famílias ou a "puba" (foto) , utilizada para
fazer tapioca.
 

 Lidando com a morte
 
Vista de rua em Agrestina-PE: monumentos
 como esses são colocados em ruas ou estradas,
 no local onde um dos moradores morre,
por causas naturais ou "morte matada".
 
 Enfrentando os mosquitos

Vista interna de casa em Agrestina-PE: possuir
um mosqueteiro é essencial, pelo grande
 número de pernilongos (ou murissocas), seja nos sítios
 ou nas casas da cidade.

 
A beleza que vem da simplicidade
 
Vista de casa em de sítio de Agrestina-PE:
detalhes da decoração de casa (porta toalhas
de cozinha).

 
Vista de casa em de sitio de Agrestina-PE: detalhes
da decoração de casa (suporte para utensílios
 de cozinha).


Vista de casa em de sitio de Agrestina-PE: detalhes
da decoração de casa (suporte para copos e canecas).

Vista de casa em de sitio de Agrestina-PE: detalhes
 da decoração de casa (suporte para itens de limpeza).

 

Vista de casa em de sitio de Agrestina-PE: detalhes
 da decoração de casa (suporte para itens de cozinha).

 
Bebendo água de coco
 
Vista de sitio em Agrestina-PE:
a maioria das casas possui coqueiros para
 consumo familiar.

 
Vista de sitio em Agrestina-PE:
após ser retirado, o coco verde é
cortado para que se possa beber a água.

 
Vista de sitio em Agrestina-PE.

 
Vista de sitio em Agrestina-PE: se
o coco já estiver seco, pode-se retirar
a casca, obtendo-se o mesmo coco que
compramos no mercado.

 
Vista de sitio em Agrestina-PE:
coco seco, retirado no quintal de casa!

 

 Preparando o feijão para vender
 
Vista de feijão secando em sitio de Agrestina-PE:
após ser plantado nas lavouras pelas famílias,
 o feijão é arrancado e colocado para secar, evitando
 assim que brote.

 
Vista de feijão sendo "batido" em sitio de Agrestina-PE:
 esse processo faz com que o feijão seja separado de sua
casca.

 
Vista de feijão sendo "separado" em sitio de
Agrestina-PE: mesmo sendo batido,
o feijão continua com impurezas e
precisa ser peneirado e depois "catado"
para selecionar o produto final, a ser
comercializado.

 Fogão de lenha
 
Vista de fogão a lenha, em sitio de Agrestina-PE:
praticamente todas as casas possuem além de
fogões modernos, um fogão a lenha nos fundos,
 seja para assar um milho ou mesmo para cozinhar.
Vista de fogão a lenha, em sitio de Agrestina-PE.

  
Outras ocupações além do sitio

Vista interna de uma marcenaria na cidade de Cupira-PE:
atualmente esse tipo de atividade é utilizada apenas
em reparos ou produções de pequenos itens sob medida.
As compras de móveis são feitas em lojas, assim como
em São Paulo. 

 
É bem comum que as casas possuam máquinas de costura,
utilizadas para pequenos reparos, produção de roupas para
a família, ou mesmo para costurar para fora, como forma de
reforçar o orçamento. Foto de casa em
Cupira-PE.

 



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